sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Não era substituindo pessoas que os problemas passariam, por milagre, a ser resolvidos.



O ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, defende que o problema das dívidas soberanas é europeu e deve ser resolvido nesse plano - com um recuo de Angela Merkel. Mas deixa claro que este Governo tem condições para prosseguir, sem remodelações, se a oposição não lhe obstruir o caminho. Para Belém, um recado: deve contribuir para a estabilidade.

O limite de 7% sobre os juros da dívida foi já ultrapassado. A partir daqui, até onde vai ser possível sobreviver sem pedir ajuda externa?

O processo de subida das taxas de juro é, naturalmente, algo de preocupante, porque os encargos sobre a dívida pública pesarão na gestão futura dos exercícios orçamentais. Uma coisa é certa: do lado do Governo, tudo temos feito para criar condições de consolidação orçamental. O Governo não se afasta destes objectivos - e é importante, tanto no plano interno como no plano internacional, que se conheça esta firme intenção. Mas temos aqui um problema que afecta a própria estabilidade do euro e não é exclusivamente, longe disso, um problema português - embora tenhamos de assumir a nossa parte de responsabilidade no enfrentar do problema. E quero exprimir aqui, também, uma preocupação no sentido de acreditar que as instituições europeias façam aqui a sua parte para criarmos estabilidade nos mercados internacionais.

Acredita que quando Portugal tiver de voltar ao mercado da dívida, no início de 2011, o pior já terá passado?

Quero acreditar que, com o conhecimento dos primeiros resultados do exercício orçamental de 2011, que serão conhecidos no final do primeiro trimestre de 2011, estaremos em condições de demonstrar, por factos e não apenas por intenções, a concretização plena dos objectivos que nos movem.

Os juros, porém, continuam a subir. O Governo está de pés e mãos atadas à espera do próximo Conselho Europeu?

O Governo faz aquilo que pode e deve fazer: criar as condições para cumprir com rigor e determinação o que está na sua mão executar. Naturalmente, o Governo tem a expectativa que o quadro europeu possa evoluir no sentido de alterações que sejam favoráveis à estabilização do euro no conjunto dos mercados internacionais.

Mas acredita que será possível fazer a chanceler Angela Merkel recuar na intenção de criar o fundo permanente, que o próprio ministro das Finanças responsabilizou pelo pânico criado nos mercados?

Soubemos todos hoje [ontem] que a sra. Merkel ecoou essa preocupação - e apelou aos mercados no sentido de terem maior tranquilidade para que de alguma maneira todos possam concorrer para essa estabilização desejável. E quando a própria chanceler alemã verifica que há alguns efeitos "perversos" daquilo que é um propósito relativamente à gestão dos mecanismos de crise no quadro da UE, certamente esperamos que o Conselho Europeu possa fazer aí a adequada reflexão - é isso que posso afirmar como uma aspiração portuguesa.

O ministro das Finanças mantém credibilidade? Esta semana ouvimos vários apelos a uma remodelação, mesmo na área do PS, de João Proença a Vital Moreira...

Acho que faz tanto sentido ao secretário-geral da UGT defender critérios de remodelação do Governo como faria que um membro do Governo aparecesse a defender critérios de remodelação do Governo. Aos sindicatos o que é dos sindicatos, ao Governo o que é do Governo. As remodelações governamentais não se anunciam - num dia, se eventualmente forem feitas, serão feitas por quem as pode fazer, que é o primeiro-ministro. Agora, o que quero sublinhar é que o Governo está coeso, determinado. O que o País menos precisa é que se procure agora encontrar um outro foco de especulação e de desestabilização, depois de termos resolvido o principal problema - a viabilização do OE.

Mas essa desestabilização não se faz sentir nas contas públicas? Não é um problema grande de mais, o que está nas mãos deste ministro, o de salvar o Governo?

Se esses são problemas grandes de mais que teriam como efeito o pôr em causa este ministro das Finanças, era caso para perguntar se outro ministro das Finanças não teria os mesmos problemas. Sejamos razoáveis. Há problemas? Naturalmente eles têm de ser resolvidos. E não era substituindo pessoas que os problemas passariam, por milagre, a ser resolvidos. Os problemas existem, têm de ser enfrentados por quem tem competência própria para o efeito.

António Vitorino disse esta semana que o Governo acordou tarde para o problema da dívida soberana. Concorda?

Tem sido argumentação recorrente...

Mas não no PS...

Fazer de treinador à 2.ª-feira é muito mais fácil do que prever as situações antes do jogo. A verdade é que o Governo esteve persuadido que instabilidade dos mercados tenderia a abrandar ao longo do ano. Infelizmente isso não aconteceu e implica que teremos de ser mais enérgicos na tomada de medidas. Uma coisa é certa: as medidas foram agora tomadas, as mais drásticas.

As medidas deste OE podem levar o PS a perder o poder, como disse Almeida Santos - coloca-se um cenário de censura pós-Orçamento?

A tendência para andarmos a caminhar à beira do abismo não favorece o País - que precisa de estabilidade, de tranquilidade política, para que haja condições para executar os compromissos. Todas as energias colocadas no ano de 2011 deveriam ser neste sentido.

Ainda num cenário de censura ao Governo, acredita que no PCP e no Bloco exista vontade de segurar o Governo?

O que tenho verificado é que eles têm uma lógica concorrencial entre si para ver qual é o que se opõe de forma mais dura, sistemática e radical ao Governo. Gostaria que esses partidos pudessem mudar de posição, mas a sua lógica e cultura é a do contrapoder. Não digo isto com satisfação.

Paulo Portas insiste num Governo de salvação nacional, com José Sócrates fora. Como comenta?

Acho extraordinário que o líder de um partido se permita defender condições para defenestrar a liderança de outro partido, que foi democrática e legitimamente alcançada, em sede partidária e sufragada pelos eleitores. Mas o que é importante é que nos perguntemos o seguinte: o Governo em funções tem condições para executar o Orçamento? A resposta do lado do Governo é "sim, temos condições" para executar essa tarefa, se não nos criarem politicamente obstrução. Portanto, aquilo que os partidos da oposição podem assumir, nomeadamente o CDS, é não criarem obstrução.

Com a subida actual das taxas de juro, sem retrocesso da Alemanha no Conselho Europeu, o Governo terá essas condições?

Que a situação está difícil é manifesto para todos nós, mas fazer futurismo também seria excessivo. Aquilo que está ao alcance do Governo fazer deve fazê-lo com toda a energia, deve garantir aos portugueses e no plano internacional que o PEC, nomeadamente no que respeita ao controlo do défice, será assegurado. Esta é a nossa responsabilidade e missão.

Manuel Alegre disse acreditar que as presidenciais podem ser o primeiro passo para um domínio do país político pela Direita em 2011. Crê neste cenário?

Eu sou um institucionalista. Ou seja, um Presidente da República tem as competências que a Consti-tuição prevê, não outras. E o que devemos ter todos é uma interpretação saudável do princípio da separação de poderes - e da cooperação entre os poderes - presidenciais. Ganhe quem ganhar deve ter a responsabilidade elementar de contribuir para a estabilidade política do nosso país.


Fonte: Diário de Notícias

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